Por que sentimos dor e qual é sua importância para o nosso corpo?

A dor é uma sensação desagradável que serve como um alerta de que algo dentro do nosso corpo não vai bem (e precisa ser tratado) ou de que certos comportamentos ou objetos externos podem nos causar danos. Sendo assim, uma vida sem nenhuma sensação de dor poderia significar um risco para a saúde.

“A dor é um sintoma fundamental, pois alerta o indivíduo para a necessidade de assistência médica, que algo está errado e precisa ser verificado”, explica Marucia Chacur, professora e pesquisadora do ICB-USP (Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo).

[A dor] é considerada o quinto sinal vital, é uma modalidade sensorial que gera sofrimento ao indivíduo, e é uma das grandes preocupações da humanidade desde o início da civilização.”

De acordo com a Sociedade Brasileira de Estudos da Dor, 30% da população brasileira sofre ou se queixa de dor. Ela pode ser crônica (com duração prolongada, com as causadas por inflamações nas articulações ou que acometem pacientes com câncer), aguda (manifesta-se por um tempo mais curto, como cólicas, dores pós-operatórias ou decorrentes de um trauma) ou recorrentes (por exemplo, as enxaquecas, que se repetem com certa frequência).

Há ainda diferentes classificações da dor segundo a sua localização, forma e intensidade. De modo geral, ela faz um percurso determinado no nosso corpo: primeiro, a dor precisa ser percebida por células receptoras, localizadas na pele e nos órgãos internos; depois, ela é transmitida pelos nervos até a medula espinhal; por último, é interpretada como dor por uma parte específica do cérebro, o tálamo.

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Os medicamentos disponíveis no mercado podem atuar em diferentes etapas desse processo.

“Hoje já sabemos que existem fibras distintas responsáveis por conduzir diferentes tipos de dor até a medula, que é onde está o que chamamos de ”portão da dor”, capaz de selecionar o que vai para o cérebro”, diz o neurologista Gabriel de Freitas, pesquisador do Instituto D”Or de Pesquisa e Ensino.

Algumas pessoas, no entanto, podem sofrer alterações em alguma etapa desse processo, e perdem a capacidade de perceber tipos específicos de dor. Isso pode ocorrer tanto como consequência de mudanças em certos componentes genéticos ou alguma doença que impeça essa sensação.

As pessoas que não sentem dor, seja por uma alteração genética ou por uma perda das terminações sensitivas, frequentemente se machucam muito, sangram, têm inflamações e não percebem que se machucaram”

Gabriel de Freitas, neurologista

Os casos congênitos são raros, mas um exemplo recente é o da italiana Letizia Marsili, que tem outros cinco familiares com grande resistência à dor. Por conta de uma mutação genética, eles não sentem queimaduras ou fraturas mais graves. Apesar de significar uma ameaça para esses indivíduos, seus genes são objeto de estudo de um grupo de pesquisadores que, no futuro, podem propor novas drogas para o bloqueio da dor.

Bem mais comum do que as ocorrências genéticas, essa mudança de sensibilidade também pode ocorrer ao longo da vida e afetar partes específicas do corpo. Em pacientes diabéticos ou com diagnóstico de hanseníase –doenças que afetam os nervos periféricos do corpo—, por exemplo, essa perda de percepção da dor pode causar até a amputação de membros machucados.

A professora da USP, que atua no Laboratório de Neuroanatomia Funcional da Dor, afirma que por muito tempo a ciência levou em consideração apenas os aspectos fisiológicos envolvidos na dor. Hoje, no entanto, sabe-se que essa sensação varia de acordo com fatores culturais, emocionais, de idade, gênero e até a religião do paciente.

“Diferenças na percepção dolorosa têm sido documentadas na literatura, onde mulheres percebem e relatam mais dor que homens, procuram auxílio médico com maior frequência que homens e fazem uso de analgésicos em maior quantidade. A intensidade e sensação da dor variam não somente de um indivíduo para outro, mas também de acordo com as diferentes culturas e geralmente estão associadas a experiências sensoriais e emocionais desagradáveis percebidas individualmente”, diz.

Por esse motivo, é difícil identificar qual seria a dor mais intensa para o ser humano. “Isso não é possível, porque cada indivíduo sente dor baseado nas suas memórias, na sua forma de perceber o ambiente, na forma de lidar com a vida e com o meio em que está inserido”, afirma Chacur.

Apesar disso, o dia a dia no hospital sugere algumas das dores mais temidas.

“Segundo o relato dos pacientes, sabemos que alguns tipos dor são muito intensas, como, por exemplo, dores nas vísceras, mais mal definidas, como de um cálculo renal. Também podemos citar as dores causadas por fratura exposta, meningite ou aneurisma, que classicamente são descritas pelos pacientes como as mais fortes que sentiram na vida”, diz o neurologista.

Fonte : Site Panorama Farmacêutico