PIOR QUE O SOBREPESO É O SEDENTARISMO

“Melhor um gordinho ativo que um magro sedentário.” A frase da endocrinologista Cíntia Cercato, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), abala o mito de que o sobrepeso e a obesidade estariam diretamente relacionados à falta de saúde e a um maior risco de morrer. Segundo a especialista, grandes estudos populacionais vêm mostrando como essa condição aumenta o risco de uma série de doenças e, sim, reduz a expectativa de vida. Mas várias evidências científicas também revelam que mais importante que o peso em si é o fato de essa pessoa ser ativa ou não. “O sedentarismo é fator de risco mais importante que a própria obesidade”, pondera.

Linda Bacon, ph.D. em fisiologia com foco em nutrição e controle de peso, professora do Departamento de Biologia do City College of San Francisco e de nutrição na University of California, é autora de livros de referência na área: Body respect and health at every size (Corpo respeitado e saúde em qualquer peso, em tradução literal). Segundo a pesquisadora, a taxa de mortalidade de homens e mulheres magros, mas sedentários, é, pelo menos, duas vezes maior que os índices de morte de homens e mulheres obesos, porém, fisicamente ativos. “Na realidade, qualquer que seja a composição corporal, os sedentários têm maior risco de morrer que os fisicamente ativos, independentemente do quanto pesam. A atividade física é o fator-chave para essa proteção, não o peso.”

É possível ser gordo e saudável. Segundo Cercato, assim como existe o obeso metabolicamente saudável, também há o magro metabolicamente obeso. Por isso, nem todos os tipos de obesidade podem ser associados a um maior risco cardiovascular. A gordura abdominal, aquela que se concentra na região da barriga, é a mais perigosa e pode ocorrer tanto em obesos quanto em magros. “A pessoa acima do peso ou mesmo na faixa da obesidade, sem a gordura predominantemente abdominal, pode ter exames clínicos normais. Assim como uma pessoa de Índice de Massa Corporal (IMC) normal pode ter todas as alterações associadas à obesidade. É por isso que não se olha o IMC isoladamente. Ele conta, mas não é o único indicador de risco. Também é preciso observar como a gordura está distribuída no corpo e o quanto essa pessoa se exercita, porque pior que ser obeso é ser sedentário”, alerta.

Apesar de a obesidade vir acompanhada de um aumento significativo na prevalência de diabetes tipo 2, um dos mais importantes fatores de risco para doença cardiovascular, hipertensão, insuficiência renal e, até mesmo, alguns tipos de câncer, para o cardiologista e médico do esporte Marconi Gomes da Silva, presidente da Sociedade Mineira de Medicina do Exercício e do Esporte (Smexe), talvez o maior de todos os problemas esteja no sedentarismo. E a população mundial está cada vez mais sedentária. O excesso de peso também se torna um problema maior quando associado a alguma anormalidade metabólica. “Obviamente, quanto mais peso se tem, maior a probabilidade de uma anormalidade metabólica, o que não é uma regra”, comenta o médico.

Não há dúvidas de que o segredo para se manter saudável é o exercício. “Se você está magro ou acima do peso, exercite-se. Essa é a melhor forma de ser metabolicamente saudável, independentemente de seu peso. Mas não podemos nos enganar, embora cada vez mais pesquisas sugiram que o excesso de peso por si só pode não ser o maior responsável pelas mortes prematuras e doenças metabólicas. Ainda assim, pessoas nesse grupo estão mais propensas a desenvolver outros fatores de risco metabólicos que podem contribuir para o surgimento de doença crônicas”, alerta Marconi.

Segundo o médico do esporte, bastam 30 minutos de atividade física de intensidade moderada em cinco ou mais dias por semana, ou 75 minutos de atividade vigorosa ou mesmo 150 minutos de uma combinação de exercícios moderados e vigorosos, por semana. Se a pessoa estiver sedentária há muito tempo ou muito acima do peso, recomenda-se uma avaliação médica antes de iniciar atividades físicas de maior intensidade, sobretudo para prevenir lesões osteomusculares e riscos cardiológicos.

GENÉTICA Foi só parar com o exercício diário e o publicitário Filipe Thales, de 32 anos, experimentou o primeiro porém em relação ao seu excesso de peso, característica que o acompanha desde a infância e que nunca o incomodou. Apesar de a maioria da família estar, há vários anos, acima do peso, “a saúde vai bem, obrigado”. Os avós de Filipe, por exemplo, morreram com mais de 90 anos. A caminhada de 40 minutos é um hábito do publicitário, que deu uma rápida parada em função de compromissos profissionais. A pressão, até então na casa dos 12×8, subiu para 13×8, o que ele pretende reverter com o retorno à atividade.

Filipe fez dieta uma única vez, quando quebrou os tornozelos e precisou perder 10% do peso para ajudar na recuperação. Mas diz não comer o suficiente para mantê-lo nos 125 quilos atuais. Segundo Cercato, é muito comum a pessoa acima do peso ter dificuldade para emagrecer, por pressão da genética. Há quem tem predisposição para ser obeso, mesmo que não coma tão mal. Mas também é mais comum ver obesos com hábitos ruins do que com hábitos saudáveis. “A questão é: o quanto a obesidade te faz mal? O quanto te traz problemas? Se a pessoa está acima do peso, mas não é sedentária, tem os exames sob controle e está feliz, não é preciso se render a essa ditadura da magreza.”

Fonte: ESTADO DE MINAS