Gordura fora dos vasos sanguíneos pode evitar infarto

O estudo da Universidade de Oxford descobriu que os vasos sanguíneos enviam um sinal de S.O.S para as gorduras a seu redor a fim de combater novos ataques cardíacos.

De acordo com o professor Charalambos Antoniades, que conduziu o estudo, o chamado “paradoxo da obesidade”, conhecido há cerca de uma década, sugere que essa gordura em torno dos vasos sanguíneos pode ser benéfica a esses indivíduos. Isso porque pacientes com sobrepeso e doença arterial coronariana apresentam menor mortalidade do que indivíduos bem nutridos.

— O que ainda precisamos descobrir é o porquê — afirma o pesquisador, que participa de congresso de cardiologia em Manchester, desde segunda-feira.

A sua descoberta, um desdobramento do “paradoxo da obesidade”, demonstrou que a gordura perivascular (fora dos vasos) foi capaz de identificar a presença de produtos de oxidação nos tecidos vasculares e “responder” aumentando a produção de adiponectina.

A adiponectina é um hormônio produzido pelo tecido adiposo e que ajuda a regular o estresse oxidativo vascular (relacionado a complicações cardiovasculares).

— Nossa pesquisa descobriu, pela primeira vez, que, quando nossos vasos estão sendo atacados por alguns produtos tóxicos do metabolismo (radicais livres, que podem levar a ataques cardíacos ou acidentes vasculares cerebrais), eles enviam sinais de S.O.S para a gordura em torno deles (perivascular). Se a gordura for saudável, pode ajudar os vasos, enviando adipocinas anti-inflamatórios e antioxidantes para protegê-los — explica o professor ao O Globo.

Ele afirma ainda que, se essa gordura não for “boa” pode ocorrer o contrário: ou ignorar os sinais ou enviar uma resposta prejudicial aumentando o dano.

— A gordura em torno desses vasos tem “uma cara boa e uma cara ruim”. E agora estamos tentando entender como mudar de um rosto para o outro. Se dominarmos esta troca entre as duas faces de gordura, poderíamos melhorar a qualidade dela — comenta o pesquisador que, realça que o ideal no caso do sobrepeso ainda é fazer exercício físico e manter uma dieta equilibrada. — Esta é a única recomendação segura. Até os pesquisadores trabalharem mais sobre este tema e ver se há alguma maneira de “reprogramar” a gordura em nosso corpo para mantê-la sempre com a “cara boa”.

ESTUDO COM DIABÉTICOS

Os estudos, conduzidos pelo professor Charalambos analisou tecidos coletados de pacientes submetidos à cirurgia cardíaca. E mostrou que a adiponectina aparecia em quantidade maior do que o esperado. É que os diabéticos têm menor capacidade de produção de adiponectina e, por isso, desenvolvem mais ataques cardíacos e derrames. Sua gordura é disfuncional.

— A gordura tem tido uma má reputação, mas nós, finalmente, estamos aprendendo mais sobre como e por que certos tipos de gordura são essenciais para uma boa saúde do coração — comentou o professor de medicina cardiovascular de Oxford. — Enquanto a maioria das gorduras é perigosa, existem alguns bons produtos químicos que ajudam a beneficiar a saúde.

A professora de cardiologia da Unifesp, Maria Cristina de Oliveira Izar também endossa a tese de que o sobrepeso não é o ideal, mesmo que seja acompanhado de menor mortalidade. E que a descoberta da Universidade de Oxford não pode pautar o “desleixo” com a saúde:

— Não quer dizer que o sobrepeso e a obesidade sejam fatores de proteção. Apenas um tipo específico de tecido adiposo, o marrom, pode produzir substâncias benéficas ao coração. O ponto chave aqui é contrabalancear a adiponectina em diabéticos, já que eles foram o alvo do estudo, aumentando sua produção. E não quer dizer que ser gordinho é benéfico.

ESQUEÇA O CHURRASCO

Stephan Lachtermacher, do Instituto Nacional de Cardiologia (INC), explica que a gordura nem sempre é maléfica ao corpo humano. Mas que uma pessoa com problemas cardíacos, alvo da pesquisa britânica, não são consideradas saudáveis:

— O indivíduo com sobrepeso, sobretudo os que possuem o que chamamos de gordura saudável, vai favorecer a produção de mediadores anti-inflamatórios que serão ativados no processo do enfarto. Mas veja que esse indivíduo já teve um machucado muscular grave no coração e isso não é nada bom — declarou o cardiologista.

Segundo ele, a gordura tem várias funções importantes, como ajudar na fluidez da membrana das células e auxiliar o controle da temperatura do corpo, entre outras. Explicou que, quando metabolizada pelo organismo, a gordura pode produzir o “mau colesterol” (LDL) ou o “bom colesterol” (HDL), também dependendo de sua origem.

O endocrinologista Pedro Assed, pesquisador do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares da PUC-Rio, afirma que não é comendo churrasco, por exemplo, que o indivíduo vai aumentar seu nível de gordura boa:

— É sabido que a deposição de gordura no organismo depende principalmente de fatores genéticos. E se houver a presença de deposição de gordura na sua forma visceral o que é o mais comum de acontecer, não haverá benefício nenhum — pondera o endocrinologista. — Essa gordura visceral produz mediadores inflamatórios ruins que estimulam a formação de placas de aterosclerose dentro dos vasos, pioram a resistência insulínica, estimulam a formação de LDL que, em última análise, leva o indivíduo a se tornar hipertenso e diabético.

Fonte: Portal O Globo