Diabetes deveria ser dividido em 5 tipos em vez de 2, dizem cientistas

Hoje o diabetes é classificado apenas em tipo 1 ou tipo 2, mas pesquisadores finlandeses e suecos defendem que haja cinco tipos ou mais.

O objetivo de ampliar a classificação da doença é aperfeiçoar o diagnóstico e a prescrição de tratamentos.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, há hoje 422 milhões de pessoas com a doença —cerca de 6% da população. A prevalência da doença no mundo mais que quase dobrou entre 1980 e 2014, em grande parte por conta da obesidade e do sedentarismo. Na divisão atual, o tipo 2, ligado ao estilo de vida, é o mais comum. No Brasil, 90% dos casos são do tipo 2, causado pela crescente resistência do corpo à insulina (o hormônio que sinaliza para o corpo capturar o açúcar que circula pelo sangue) ou à produção reduzida dela.

Uma subdivisão em cinco tipos —três tipos graves e dois leves— revelaria a realidade heterogênea do doença, afirmam os autores do estudo  publicado na revista médica Lancet.

A pesquisa, feita com dados de mais de 14 mil pessoas com a doença recém-diagnosticada, leva em conta outras variáveis além dos níveis de glicose no sangue, como idade, IMC (índice de massa corporal), concentração de peptídeo-C —que marca a quantidade de insulina produzida— e complicações.

“É uma doença que tem um nome, mas vários sobrenomes”, afirma João Salles, vice-presidente da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes).

Na nova divisão proposta, a Said (diabetes autoimune severa, em tradução livre) é um dos tipos graves e corresponde ao que hoje conhecemos como diabetes tipo 1 ou a uma forma latente em adultos. Ela é caracterizada pela idade precoce na qual a doença aparece e pela deficiência da produção de insulina.

Outras duas subdivisões mais graves são a Sidd (diabetes de severa deficiência de insulina), com baixa secreção de insulina e IMC relativamente baixo, e a Sird (diabetes de severa resistência à insulina), já caracterizada por um IMC mais alto.

Os tipos leves são MOD (diabetes relacionada à obesidade), que, como o nome já indica, está ligada à obesidade, mas sem resistência à insulina, e Mard (diabetes mais relacionado à idade avançada).

Uma classificação mais detalhada do diabetes pode abrir portas para o início da medicina de precisão na doença, segundo os autores.
Rogerio Silicani, do Hospital Israelita Albert Einstein, afirma que o estudo pode representar um primeiro passo, em dirigir os tratamentos para grupos da doença que têm características em comum. “O paciente obeso que chega com diabetes tipo 2 é muito diferente do paciente magro que chega com diabetes tipo 2.”

 

IMPACTOS

Além de tentativas e erros com diferentes medicamentos, hoje o tratamento do diabetes vai muito do “feeling” e da experiência do médico, segundo Salles.

Com uma padronização mais detalhada, individualizar o tratamento poderia se tornar mais simples.

“Cada paciente com diabetes tem uma doença diferente e uma resposta diferente aos medicamentos”, diz Salles, o que torna importante um acompanhamento regular por profissionais de saúde.

Contudo, o detalhamento da doença apresentado no estudo ainda é uma realidade distante da prática clínica e tornaria os diagnósticos mais caros. Exames para identificar elementos como peptídeo-C e anticorpos que agem contra a produção de insulina teriam um custo absurdo, segundo Luiz Turatti, ex-presidente da SBD e também médico no Einstein.

Ainda há um longo caminho a se percorrer antes de qualquer tipo de alteração em relação à classificação do diabetes. Os próprios autores do estudo afirmam que a pesquisa que realizaram tem limitações, como o foco em uma população escandinava, sem considerar outras etnias.

A pesquisa também ignora algumas outras complicações relacionadas ao diabetes, como pressão alta e colesterol alto.

Segundo Salles, mesmo sem a nova classificação há formas simples de melhorar o tratamento do diabetes no Brasil —no país, cerca de 75% das pessoas não têm o diabetes tipo 2 controlado e, no tipo 1, o índice chega a 90%.

O especialista afirma que, como a doença é assintomática, é muito comum que os pacientes abandonem o tratamento, o que pode resultar em graves complicações posteriormente, como cegueira e amputações. O tempo médio do uso de medicamentos é em torno de 3 meses.

 

Fonte: Phillippe Watanabe, Folha de São Paulo.