O segredo está na serotonina.

Para solucionar a questão, é preciso entender como funcionam os neurotransmissores, substâncias capazes de enviar sinais entre as células nervosas de todo o organismo. Em destaque, a serotonina, que ajuda no equilíbrio de aspectos fundamentais da saúde.

Considerada um dos mais poderosos reguladores do humor e do apetite, a serotonina é produzida no cérebro e no sistema nervoso de todos os seres humanos e animais.

Dependendo da hora do dia ou da estação do ano, sua atividade pode sofrer oscilações.

Entre as mulheres, esse fenômeno é mais comum, e essa seria uma das razões por que esse grupo é mais propenso à depressão, bem como às mudanças de temperamento e compulsões por determinados alimentos, principalmente no período pré-menstrual.

A nutricionista clínica Elenir Strutzel explica que, além do desejo de consumir doces e carboidratos, baixos níveis dessa substância têm sido vinculados a dores de cabeça, insônia, ansiedade, depressão, transtornos alimentares e fibromialgia. “Já o excesso geralmente tem como causa o uso inapropriado de medicamentos que reforçam seu efeito”, diz a especialista.

Em excesso, prejudica

O resultado é a chamada síndrome serotoninérgica, que pode acometer usuários de triptano, remédio utilizado para controle da enxaqueca, combinado com inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) ou inibidores seletivos de recaptação da serotonina e noradrenalina (ISRSN).

Adriano Segal, diretor de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO), fala que esse quadro se caracteriza por alterações mentais (irritabilidade, agitação, confusão etc.) e musculares (tremores, rigidez), sintomas neurológicos (convulsão, coma), bem como sinais autônomos (febre, taquicardia, hipertensão). “Essas manifestações podem ser leves ou graves, e devem ser tratadas rapidamente”, alerta.

Carol Hart, escritora especializada em ciência e saúde, autora do livro Segredos da serotonina (Cultrix), afirma que algumas pessoas têm predisposição inata a essas flutuações e, por isso, são mais vulneráveis às situações de estresse, e até ambientais, fatores que contribuem para o aumento da fome e das oscilações de humor. “Hereditariedade também pode estar relacionada”, acrescenta.

Mas como seria possível identificar alterações nos níveis da atividade serotoninérgica? A pesquisadora responde que a própria pessoa passa a observar em si algumas mudanças comportamentais, que podem ser descritas como “baixo astral ou mau humor sem motivo aparente. E isso não é algo esporádico, ou um leve problema de humor e alimentação. É uma sensação bastante pronunciada”.

Exame difícil

Quando os sintomas dessas flutuações são intensos e repetidos, o melhor a fazer é procurar ajuda médica. Neurologistas, endocrinologistas, nutrólogos, psiquiatras e até nutricionistas poderão avaliar e identificar o problema, além de orientar sobre a melhor forma de tratamento em cada caso. Segundo a nutróloga Maria Del Rosario, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN), como 97% da serotonina corporal é sintetizada no intestino, os exames laboratoriais que podem auxiliar num diagnóstico são o serotonina plaquetária (sangue), ou o ácido 5-hidroxi-indolacético (urina), utilizado como marcador tumoral para uma doença intestinal rara (síndrome carcinoide).

Mas a endocrinologista Maria Edna de Melo, do Grupo de Obesidade e Síndrome Metabólica do Hospital das Clínicas da FMUSP e membro da ABESO, pondera: “A dosagem de serotonina no sangue periférico não representa o que ocorre no cérebro. Assim, não existe um teste útil para essa finalidade”.

Supressora da fome

Para além das oscilações de humor, a serotonina pode influenciar também o comportamento alimentar. Outras substâncias também estão relacionadas, mas acreditase que ela seja a responsável pela supervisão de todo o processo. A justificativa para isso é que a serotonina é considerada um supressor natural da fome, já que é capaz de estimular a sensação de saciedade. Daí sua influência, ainda que de forma indireta, mas forte, no controle do peso.

De acordo com a pesquisadora Carol Hart, é fácil entender esse mecanismo, pois é comum que estados emocionais sejam desencadeadores de alterações do apetite. “Algumas pessoas perdem a vontade de comer quando estão preocupadas, tristes ou deprimidas. Outras comem em excesso para aliviar seus sentimentos.”

Monte um cardápio baseado em proteínas e carboidratos integrais, em que esses últimos estejam presentes num horário do dia quando o humor for pior

Triptofano no prato
Um estudo publicado pelo Journal of Psychiatry & Neuroscience, de autoria de Simon N. Young, do Departamento de Psiquiatria da MacGill University Montreal (Canadá), mostrou que há várias maneiras de estimular a produção dessa substância, sem usar remédios. O estudo foca o tratamento da depressão, mas destaca a dieta numa receita que incorpora psicoterapia, exposição à luz solar e exercícios físicos.

A indicação para a mudança nos hábitos alimentares tem uma razão de ser: a serotonina é uma molécula produzida no cérebro e no corpo a partir do triptofano (também como 5-HTP), aminoácido essencial, encontrado em todos os alimentos ricos em proteína (laticínios, ovos, carne e peixe, sementes de girassol, castanhas, diversas verduras e legumes). De acordo com a nutróloga Maria Del Rosario, existem evidências de que a síntese de serotonina cerebral possa ser modulada dieteticamente pela oferta desses macronutrientes, destacando-se também a ingestão de carboidratos complexos. Alimentação deficiente em triptofano desencadeia humor deprimido, irritabilidade e agressividade. O seu contrário ajuda a controlar o apetite, principalmente em portadores de bulimia, ou problemas de compulsão alimentar.

Carol Hart explica como isso funciona: “Quando esses alimentos são digeridos, seus aminoácidos, inclusive o triptofano, penetram na corrente sanguínea e são transportados para os tecidos, onde são usados na síntese de proteínas do próprio organismo e de outras moléculas essenciais, como a serotonina”.

Assim, para manter a balança sob controle, a ideia é aumentar os níveis de serotonina de forma natural, aliviando os maléficos sintomas dos baixos níveis. Como coadjuvante, a atividade física, de preferência ao ar livre, porque o movimento e a luz solar igualmente estimulam a produção de serotonina. “E o exercício nem precisa ser vigoroso: caminhar, andar de bicicleta, nadar em qualquer velocidade e até tricotar podem ajudar”, diz a escritora.

Para driblar a compulsão por açúcar e carboidratos simples (como doces e pão), o conselho dos especialistas é substituílos por alimentos mais saudáveis. “Planejar um cardápio baseado em proteínas e carboidratos complexos (batata, feijão, pão integral), em que esses últimos estejam presentes num horário do dia quando o humor e outros sintomas forem piores. Assim, se alguém tende a se sentir sem energia ou ansioso à tarde, seu lanche deve ser à base de carboidrato. À noite, o jantar deve ser só proteína.”O psiquiatra Adriano Segal é menos otimista quanto à dieta alimentar e à possível supressão ou diminuição do uso de remédios que controlam a serotonina. “Lembro que essa alternativa não é aprovada como tratamento de obesidade. Apenas pode ser usada como coadjuvante em alguns casos escolhidos”, conclui.

 

Fonte: VIVA SAÚDE