Nanopartícula mostra rapidamente se tratamentos contra câncer funcionam

Saber se os remédios administrados contra um câncer estão funcionando o mais cedo possível pode significar a diferença entre a vida ou a morte para um paciente diagnosticado com a doença. Atualmente, porém, essa informação em geral leva meses para ser descoberta, o que também tem altos custos físicos para o doente, devido aos muitos efeitos adversos e debilitantes dos tratamentos, e elevados gastos financeiros, já que os preços de alguns dos medicamentos mais avançados usados hoje chegam à casa dos milhares de reais por dose.

Uma nova nanopartícula em desenvolvimento por pesquisadores nos EUA, porém, pode mudar para sempre esse cenário, trazendo uma dupla vantagem. Além de levar as drogas mais diretamente até os tumores — como já acontece com algumas tecnologias do tipo —, ela carrega uma espécie de sinalizador que só é ativado quando as células cancerosas morrem, permitindo um monitoramento quase em tempo real da eficácia da terapia.
Para isso, a nanopartícula criada pelos cientistas de um laboratório conjunto da Universidade de Harvard e do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT) em associação com o Hospital da Mulher de Brigham, todos na região de Boston, usa o fato de que, quando estão morrendo, as células de nossos corpos liberam uma família de enzimas chamadas caspases. Desta forma, eles inseriram na nanopartícula uma molécula que brilha à presença dessas proteínas, o que permite uma visualização clara do quão eficaz seria o remédio contra aquele determinado tumor. Em testes com camundongos, eles tiveram êxito com nanopartículas carregadas tanto com um quimioterápico muito comum como com um avançado medicamento imunoterápico, sem prejudicar a eficiência no transporte das drogas até os tumores nem na ação das mesmas.

Resposta em horas, e não meses

— Com esta abordagem, as células brilham no momento que o medicamento começa a funcionar. Podemos determinar se a terapia contra o câncer está sendo efetiva dentro de horas após o início do tratamento — destaca Shiladitya Sengupta, um dos autores de artigo que relata a criação e os primeiros testes da nanopartícula, publicado esta semana do periódico científico “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS). — Nosso objetivo de longo prazo é encontrar uma maneira de monitorar os resultados das terapias muito cedo de forma que não administremos drogas quimioterápicas a pacientes que não estão respondendo a elas.

Embora ressaltem que os testes com a nanopartícula ainda estão em suas fases iniciais e que será necessário replicá-los e ampliá-los antes que a tecnologia chegue ao dia a dia das clínicas de tratamento, especialistas na área ouvidos pelo GLOBO ficaram animados com o anúncio de sua criação. Segundo eles, ter em mãos uma ferramenta capaz de indicar tão rápido se e como a terapia escolhida está funcionando trará grandes impactos benéficos não só para os pacientes quanto para o próprio sistema de saúde.

— Um dos maiores desafios no tratamento de pacientes de câncer hoje é saber a resposta que ele está tendo aos remédios — conta Cristiano Guedes Duque, oncologista do Hospital São Vicente de Paulo e do Instituto Nacional do Câncer (Inca), ambos no Rio. — Tradicionalmente, temos que esperar no mínimo de dois a três meses de quimioterapia para fazer um exame de imagem para ver se há uma diminuição ou não no volume do tumor. E, dependendo do câncer e do estágio em que ele foi diagnosticado, esses dois a três meses podem ser a diferença entre ele ser tratável ou não, se ainda há tempo para trocar o tratamento, ou seja, uma diferença de vida ou morte.

Opinião parecida tem Gilberto Amorim, oncologista do Grupo de Oncologia D’Or, também no Rio:

— Uma ferramenta de diagnóstico preciso da eficácia dos tratamentos como esta é o sonho de consumo dos oncologistas — diz. — Se vai ser assim que vamos fazer essas avaliações no futuro é um pouco cedo para dizer, mas se funcionar será uma evolução espetacular, com um potencial até difícil de calcular, tanto para minimizar os danos dos efeitos colaterais de terapias que não estão funcionando quanto financeiros, já que os testes incluíram uma droga imunoterápica, uma classe ultramoderna de medicamentos que muitos veem como o futuro da oncologia.

Ferramenta para pesquisa de novas drogas

Já Carlos Gil Ferreira, oncologista e vice-presidente para pesquisas da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, também vê na criação da nanopartícula uma possível revolução no desenvolvimento de novos tratamentos contra o câncer antes mesmo de se e quando ela chegar a ter aplicações clínicas.

— O avanço científico que esta nanopartícula significa para o desenvolvimento de terapias é fantástico — avalia — Ela pode mudar completamente a maneira como se desenvolvem novas drogas contra o câncer, reduzindo prazos e custos, outro grande problema na área e que chegam à casa das centenas de milhões de dólares. Isso também pode fazer uma grande diferença nos tratamentos disponíveis lá na frente.

– Fonte: Portal O Globo