Depressão deve ser prevenida desde a infância, avaliam especialistas

 

Considerada o mal do século pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a depressão já desponta como a terceira maior doença entre adolescentes e é a segunda principal causa de morte de jovens entre 15 e 25 anos no mundo.

A fim de prevenir o desenvolvimento desse transtorno mental nessa fase da vida é preciso dotar as crianças de habilidades socioemocionais para que sejam capazes, desde cedo, de lidar melhor com emoções e situações de estresse que possam desencadear a doença no futuro.

A avaliação foi feita por especialistas participantes do programa Ciência Aberta sobre depressão em jovens e adolescentes, exibido em 6 de novembro a partir do auditório da FAPESP. Realizado mensalmente, o programa é produzido pela FAPESP em parceria com o jornal Folha de S.Paulo.

“Se desde crianças as pessoas forem capazes de processar, entender e compreender melhor emoções, como tristeza, raiva e medo, elas terão muito mais clareza e condições para lidar com elas e, provavelmente, serão menos afetadas pelo estresse e outros sentimentos”, disse Adriana Fóz, pesquisadora do Laboratório Interdisciplinar de Neurociências Clínicas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em participação por vídeo.

De acordo com Guilherme Vanoni Polanczyk, professor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), a maioria dos casos de depressão e de outros transtornos mentais começa na puberdade, provavelmente por influência dos hormônios sexuais. Segundo ele, nessa fase da vida, o número de casos de depressão aumenta substancialmente, principalmente entre meninas.

“Essa diferença de casos de depressão entre os sexos se mantém ao longo da vida. Já em crianças, a prevalência de depressão está em torno de 1%”, comparou Polanczyk, que coordena o Núcleo de Pesquisa em Neurodesenvolvimento e Saúde Mental da USP e é chefe da Unidade de Internação do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria da mesma universidade.

Em adolescentes, os sintomas de depressão mais comuns são alteração de humor, caracterizada por predomínio de tristeza, melancolia e irritabilidade, juntamente com a perda de entusiasmo por atividades que despertavam interesse e prazer, além de mudanças nos padrões de sono e de apetite, maior sensação de cansaço e a persistência de pensamentos negativos sobre si e em relação ao futuro.

A existência desses sintomas por um período maior do que duas semanas e referências à morte e ao suicídio são sinais de alerta do desenvolvimento de uma quadro de depressão, que pode ocorrer uma única vez ou se repetir ao longo do tempo e resultar em um transtorno depressivo, explicaram os especialistas.

“Esse conjunto de sintomas não necessariamente implica um quadro de depressão, mas é um sinal de alerta”, ponderou Polanczyk.

O desconhecimento sobre saúde mental, a fantasia de que adolescência e juventude são períodos excelentes da vida e, portanto, não é possível estar deprimido nelas, além da opinião deturpada de que a depressão é sinônimo de fraqueza, dificultam o diagnóstico e, consequentemente, o tratamento da doença, apontaram os participantes.

“A depressão é uma vulnerabilidade que algumas pessoas apresentam em razão de um desequilíbrio neuroquímico e que precisa ser identificada e tratada. Quanto menor o tempo em que isso for feito, melhor para o paciente, que terá menos complicações ao longo da vida”, disse Sandra Scivoletto, professora de Psiquiatria da Infância e Adolescência no Departamento de Psiquiatria da FMUSP. A pesquisadora é responsável pela execução da orientação acadêmica do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência e pela residência em Psiquiatria da Infância e Adolescência no Instituto de Psiquiatria da FMUSP.

Papel da escola

Alguns fatores de risco para o desenvolvimento de depressão e outros transtornos mentais em adolescentes são a exposição ao bullying – atos reiterados de intimidação e violência física ou psicológica –, a exposição a maus-tratos e situações de violência na comunidade, além do uso de drogas.

Um dos fatores mais importantes, contudo, é a sensação de rejeição ou exclusão social, ressaltaram os pesquisadores. Alguns estudos mostraram que a sensação de solidão tem um impacto importante nos jovens e contribui para aumentar o risco de desenvolvimento de problemas de saúde mental, destacou Polanczyk.

“O adolescente, em razão de todos os processos pelos quais passa durante essa fase da vida, precisa de um grupo para se identificar e se sentir pertencente. Ele é muito mais sensível às rejeições sociais do que o adulto e a criança”, disse.

Uma vez que a escola é reconhecida como um espaço de aprendizado coletivo, além de um lugar tradicional de acolhimento, essa instituição pode exercer um papel importante para ajudar crianças e adolescentes a desenvolver habilidades emocionais, indicaram os participantes do evento.

“A aposta de ter uma escola para todos impõe para a própria instituição e para todo mundo uma experiência de convivência de lidar com as intolerâncias e com certos processos de exclusão que acontecem ali. A escola é um campo riquíssimo para acolher e criar espaços de convívio”, disse Maria Cristina Gonçalves Vicentin, professora do Curso de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Algumas das formas como a escola pode contribuir para a prevenção da depressão em adolescentes é falar mais abertamente sobre esse e outros problemas de saúde mental, desenvolver habilidades de mediação de conflitos para manejar o estresse e fortalecer os laços de convívio. É também fundamental combater fatores de risco, como o bullying físico e o virtual – nas redes sociais –, e saber identificar os sinais de instauração de um quadro de depressão.

“A escola não é o lugar para se fazer o diagnóstico de casos de depressão em adolescentes, mas o professor pode identificar um aluno que está tendo alguma dificuldade e indicar uma avaliação por um especialista”, disse Scivoletto.

Os professores, porém, precisam de apoio, em termos de desenvolvimento de competências para discutir sobre depressão em sala de aula, e outros atores importantes, como a família e a comunidade, precisam participar desse diálogo, ponderou Vicentin.

“O que a gente sabe é que o suporte, em termos de desenvolvimento de habilidades socioemocionais, e a provisão de uma estrutura de apoio pela família e, de uma maneira mais ampliada, pela comunidade são fatores importantes de promoção de resiliência pelos adolescentes para enfrentar situações difíceis e lidar com o estresse”, disse Scivoletto.

“Sem esse apoio, o adolescente vai se sentindo sozinho para enfrentar uma situação difícil e isso pode gerar uma situação de desespero e, naquele momento, ele tomar uma atitude que pode ser definitiva em uma situação que era momentânea”, explicou.

Depressão: os sintomas são desmotivação, tristeza sem motivo, desinteresse pela vida, alteração no apetite e sono, irritação e cansaço. A psiquiatra Carolina Hanna, do Hospital Sírio-Libanês, explica que a depressão tem mais de uma causa que envolve fatores comportamentais com o desequilíbrio de neurotransmissores, como a serotonina, que regula o humor, e a dopamina, responsável pela sensação de bem-estar. O diagnóstico é feito pelo psiquiatra e o tratamento engloba terapia e medicamentos, podendo ser utilizados de maneira conjunta ou não.

Esquizofrenia: a esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico que ocorre por uma predisposição genética. A psiquiatra afirma que existem estudos que mostram que se trata de uma dificuldade na comunicação entre os lados direito e esquerdo do cérebro. Geralmente se manifesta a partir dos 20 anos por meio de alucinações e delírios. Segundo a psiquiatra, a manifestação mais comum é a de ouvir vozes. O diagnóstico é feito pelo psiquiatra e o tratamento consiste em uso obrigatório de medicamentos, que bloqueiam as alucinações, associado à terapia com psicólogo, terapia familiar, para ajudar a aceitação do tratamento, e terapias ocupacionais.

Transtorno bipolar: é um transtorno mental crônico caracterizado por oscilações de humor, que podem ir de episódios depressivos e episódios de mania ou hipomania, com aumento de energia, aceleração do pensamento, humor exaltado ou irritado. Os episódios podem durar de uma semana até anos. O diagnóstico é feito de maneira clínica por um psiquiatra. O tratamento inclui medicamentos estabilizadores de humor e terapia. A psiquiatra explica que não há mudança de humor repentina, como “estar triste e depois de cinco minutos estar feliz”. Esse tipo de oscilação de humor pode se tratar de personalidade imatura, um sintoma de outra doença, o transtorno de personalidade.

Transtorno de personalidade: é um transtorno que se manifesta no início da vida adulta em decorrência de um conjunto de fatores: genética, aspectos psicológicos e o meio em que a pessoa vive. A pessoa com este transtorno apresenta um padrão de resposta emocional inflexível e fora do padrão, com grande dificuldade em se relacionar com as pessoas. O diagnóstico é feito pelo psiquiatra e o tratamento envolve terapia e medicamentos. Tem três classificações: transtornos excêntricos ou estranhos, como o transtorno paranoide; transtornos dramáticos, como o Borderline; e transtornos ansiosos ou receosos, como o transtorno de personalidade dependente.

Transtorno de personalidade borderline: também chamado de transtorno de personalidade emocionalmente instável, se caracteriza por intolerância a frustrações, sensação crônica de vazio, oscilação de humor intensa e grande vulnerabilidade com a autoimagem. Alguns casos também apresentam pensamentos recorrentes de suicídio. De acordo com a Associação Brasileira de Psicologia (ABP), pessoas com Borderline associado à depressão apresentam maior número de episódios depressivos e início de sintomas mais precocemente.

Transtorno de ansiedade: se caracteriza pelo grau exagerado em relação à ansiedade natural.  Entre os sintomas estão coração acelerado, falta de ar, tremor, suor excessivo, irritação e extrema preocupação. Os transtornos de ansiedade podem se apresentar como síndrome do pânico, transtorno de ansiedade generalizada (TAG), transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e transtorno de estresse pós-traumático. As causas combinam fatores genéticos a ambientais. O tratamento é feito por meio de terapia e medicamentos, de acordo com a orientação de um psiquiatra

Fonte: Site R7 Saúde